Reputação não é exposição
Marcas têm confundido uma coisa com a outra, empreendendo esforços que não geram o resultado esperado. Como virar esse jogo?
atualizado
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Com traje sob medida e relógio de milhares de dólares, um executivo sai de seu carro esportivo, sobe no elevador e entra triunfante no escritório, onde é observado com iração por sua equipe.
Em tempos de TikTok e reels, todos nós estamos familiarizados a esse tipo de cena. Nunca nos deparamos com tanta exposição pessoal, e o culto ao “empreendedor vitorioso” chegou ao ápice, com estratégias de marketing e comunicação bem questionáveis.
Referindo-se a esse personagem que bebe do pior do universo do coaching, alguns até podem argumentar: “mas ele tem milhões de seguidores!”. Em uma análise superficial, a intepretação do resultado tende a ser positiva. Porém, olhando para o longo prazo, o que tudo isso agrega em termos de reputação? Pouco ou quase nada.
Voltemos algumas casas, porque existe uma grande confusão sobre esse que é um dos maiores ativos de uma marca — seja de uma organização ou mesmo de um líder.
Reputação é o resultado da soma da percepção de todos os públicos sobre nós, e não de um estrato específico. Também, não é o reflexo do momento atual, mas a consequência de ações ao longo do tempo.
É o cruzamento do controlável com o incontrolável: de um lado, nossa identidade, com todos os atributos; e, de outro, a leitura social. Em outras palavras: é acúmulo.
E vai mudando conforme viramos as páginas do calendário, com avanços e tropeços. Um processo que exige construção, mas que também enfrenta elementos alheios a qualquer ilusão de planejamento central.
Considerando tudo isso, o que uma estratégia assertiva de fortalecimento reputacional deve incorporar? E por onde devemos começar?
Tenha claro aonde quer chegar
Por muito tempo, o mercado aceitou soluções aparentemente geniais vindas de grandes criativos. O apelo emocional e a forma dominavam. Isso, felizmente, já foi superado, pois essas iniciativas até podiam render prêmios badalados — mas os resultados em si, para o cliente, eram pífios.
Portanto, as ações de comunicação precisam partir do planejamento estratégico do negócio e responder aos seus objetivos e às suas metas. Ou estaremos apenas encenando uma peça de teatro.
Mapeie as fortalezas
Embora alguns até possam pensar o contrário, ninguém é bom em tudo. O trabalho de fortalecimento da reputação precisa partir da verdade.
Por mais elaborada que seja, nenhuma narrativa para de pé se não estiver ancorada na realidade dos fatos.
Então, detecte suas especialidades, seus diferenciais e seus méritos. E faça o filtro da relevância social: o que é interessante para dentro nem sempre tem importância para fora.
Identifique e prepare os porta-vozes
Um amigo costuma dizer: “não há reputação que sobreviva a uma recepcionista mal informada e com mau humor”. E mais: “o CNPJ é uma abstração; o que existe é a soma de Fs”.
Dizendo o óbvio, uma empresa é feita de pessoas. E um dos desafios está em selecionar os líderes aptos a representar uma marca, definindo os territórios de cada porta-voz.
Após essa escolha, é necessário capacitá-los, preparando o cenário para bons e maus momentos.
Faça um benchmarking completo
Ficou no ado quando um cliente de uma quitanda a comparava apenas com a concorrente direta, do outro lado da rua.
Hoje, o consumidor que compra um celular e tem uma boa experiência nessa loja deseja que ela se repita em um hotel, em uma concessionária de carros, em um restaurante.
Não há mais barreiras. Portanto, na hora do planejamento, o benchmarking precisa ser mais amplo, recolhendo o que está dando certo também em outras indústrias.
Defina para quem falar
Querer estar em todos os lugares e falar com todos os públicos é um dos erros mais comuns — e isso cobra um preço tanto em recursos como em energia.
Seria o equivalente a utilizar uma escopeta para exterminar uma barata.
Em razão disso, um dos os mais decisivos para o posicionamento de uma marca se dá ao mapear os stakeholders, definindo também quem é prioridade entre eles. E, só a partir disso, ativar os canais adequados.
Ter boa reputação é uma coisa; ser arroz de festa é outra, bem diferente.
Trace um roap
Como já enfatizado, a jornada de fortalecimento de reputação leva tempo. Não é uma corrida de cem metros. Aproveitando a analogia: aproxima-se mais de uma maratona — e com barreiras, se tal prova existisse.
Necessita de recorrência e permanência, pois iniciativas isoladas e desconectadas entre si não dão conta da complexidade da missão.
Por isso, monte um plano de ações bem estruturado. Faça os desvios, conforme a mudança do cenário vai exigindo. E persista, com a consciência de que resultados consistentes não aparecem no curto prazo.
Em suma, reputação não é o mesmo que exposição. É um patrimônio que tem menos a ver com mostrar-se para todo mundo, e mais com ser digno da confiança de quem realmente interessa.
Então, se, por acaso, você encontrar o empreendedor que mencionei no início deste artigo, por bondade, diga a ele que não caia mais na tentação da fama fácil. Pode ser bom para alimentar a vaidade, mas é inútil para o negócio.
Rafael Codonho é sócio-diretor da Critério – Resultado em Opinião Pública.